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quarta-feira, maio 30, 2007

Situações dantescas

Os memes, novamente. Depois de uma série de perguntas pessoais, ao estilo do velho questionário de colégio, desta vez a resposta à corrente, sugerida pelo Piero, é simples: qual livro está lendo?


A Divina Comédia, de Dante Alighieri, tem me acompanhado na cama todas as noites pouco antes do sono chegar. Escrito entre 1310 e 1321, o livro é dividido em cem contos que narram a viagem de Dante ao além. Desce ao mais profundo inferno, passando pelo purgatório, tendo como guia o poeta pagão Virgílio, até chegar ao paraíso, onde lhe conduz Beatriz, musa de Dante, símbolo da pureza para o autor.

Até a última noite, cheguei ao Canto XVII do Purgatório, no qual “os dois poetas alcançam a entrada do quarto recinto do Purgatório – no qual se redimem os que negligenciaram as obras da fé e da caridade. Virgílio explica a Dante como se distribuem as almas nos sete círculos do Purgatório”. Tanto no ponto no qual estou na leitura quanto no inferno, em cada um dos círculos (como andares) se encontram divididas as almas conforme o pecado que cometeram, para que ali possam pagar pelos mesmos. No último dos círculos do inferno, por exemplo, Dante encontra Lúcifer (cujo braço é três vezes o tamanho do maior gigante) e Judas Iscariotes, cuja cabeça por toda eternidade será mastigada pelo demônio.

Mais que ficção, “A Divina” é o retrato de um povo em decadência

A obra de Dante deve ser vista além das questões religiosas, pois essa não era sua intenção. Na verdade, a obra é um relato de uma decadente sociedade da Idade Média, marcada pela hipocrisia, a pressão de uma Igreja não muito idônea e os conflitos entre os senhores por terras e poder, como acontecia na Itália, em especial em Florença, terra natal do autor. O livro foi escrito no período que o escritor estava no exílio, expulso da sua cidade. Por isso, aproveita o texto para criticar seus inimigos, políticos ou religiosos, colocando-os em alguns dos círculos do inferno, sofrendo pelos crimes cometidos em vida.

Não espere muito humor ao ver o título “A Divina Comédia”. O nome se explica por ser uma narrativa que inicia na tristeza, o inferno, e termina com alegria, e também por ser escrita de forma simples e em linguagem popular, ao contrário do latim, normalmente usado nas tragédias.

“A Divina”, inclusive, é considerada a fundadora da língua italiana (ainda que a Itália, como país unido, só tenha surgido cerca de 550 anos depois). Dante fez uso da linguagem popular da sua região, acrescentando expressões de outros dialetos, conforme julgava mais adequadas. Não foi a primeira obra dele neste chamado “vulgar”, mas foi a que lhe deu maior destaque. Dante morreria dez anos após a conclusão da obra, sem nunca mais ter retornado a Florença.

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