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domingo, junho 24, 2007

Sobre a “nova” geração

Instruções para se dar bem na boate
São necessárias luzes estroboscópias, os últimos lançamentos musicais, um conjunto “beat” e aquela cara de indiferente

Condições para sobressair na nova geração:


- ter cabelo longo, não cortado nos últimos seis meses;
- saber tocar um violão perfeitamente;
- saber de cor a metade mais um das canções dos Beatles ou, ao menos, dos Rolling Stones;
- rir dos mais velhos;
- ir três vezes por ano a grandes shows;
- ter pelo menos 15 MP3 de canções de protesto;
- considerar que os pais estão fora de moda;
- ter um carro tunado;
- transformar as ruas da cidade em um autódromo;
- pedir dinheiro ao pai fora de moda cada vez que arrebenta a máquina tunada.

Como chamar os pais:


É requisito indispensável na juventude chamar os pais dos seguintes modos: velhos / caducos / decadentes / fósseis / doentes mentais / carcamanos / gagás / anciãos / chochos / senis. Serão considerados elementos nocivos à sociedade todos aqueles que chamem seus pais pelo antiguíssimos vocábulos “pai” ou “mãe”.

O que você precisa para que uma casa noturna se destaque na noite:


- música a toda (o volume da música é diretamente proporcional ao sucesso da casa);
- discoteca com mais de duzentos lançamentos de Londres e Nova York;
- persistente jogo de luzes estroboscópias da meia-noite às 4 da manhã;
- mesas super pequenas que permitam a entrada de trezentas pessoas num espaço onde só cabem setenta e cinco;
- conjunto “beat” composto por cinco cabeludos, com equipamento de som próprio com volume suficiente para cobrir a conversa de algum sujeito perdido que tenta manter um diálogo com sua namorada ou amiga;
- garçons com cara de condes tchecos;
- senhora na chapelaria com cara de sono que toma uma aspirina a cada dois minutos;
- filhinho de papai pitbull que às três da manhã briga com o companheiro da guria de saia mais atrevida;
- namorada do DJ, para evitar que ele, num momento de fraqueza, coloque um decadentes tango;

Exclusivamente para os jovens:
Como destacar-se na noite:



- fazer cara de indiferente;
- se soltar;
- dar dois passos à esquerda e dois à direita (não importa se estiver fora do compasso);
- levantar levemente os braços ou agitá-los como se estivesse remando;
- não olhar para a companheira;
- fechar os olhos;
- de vez em quando, para inspirar-se e acertar o ritmo, marcar o compasso batendo a língua;
- jamais pegar a companheira pela cintura ou pelas mãos. Lembre-se que a distância mínima que se deve estar dela é de um metro (aos sábados, por motivos de espaço, a distância pode ser reduzida a 85 centímetros);
- dar uma mexida com a cabeça para ajeitar os cabelos;
- quando acelerar o ritmo, esticar os braços e os dedos e balançar o corpo inteiro;
- voltar indignadíssimo para a mesa quando o DJ colocar uma música fora de moda;

O que um dançarino não pode fazer:


- dar pulinhos;
- marcar o compasso levantando um dedo da mão direita;
- sapatear um tema “beat” como se fosse um mambo;
- gritar “conga, conga, conga” quando o ritmo acelera;
- pegar a companheira pela cintura e dar um giro;
- fazer caretas;
- olhar de canto de olho a um espelho para se ver dançar;
- dançar um soul com passinhos de chamamé;
- tirar uma senhorita para dançar dizendo “vamos sacudir as cadeiras?”;

Conselhos para as jovens:


- cada vez que for ao teatro, em um show ou ver na TV o cantor da moda, não esquecer dos gritinhos agudos e histéricos e simular que perdeu os sentidos durante trinta segundos;
- use saia bem curta e meias 3/4 brancas. Variação: calças apertadas (mas use já, porque estão saindo de moda);
- o decote deve ser maxi com aberturas;
- pode usar botas de qualquer tipo, exceto as curtas e as brancas;
- lábios sem batom estão saindo de moda. Se está namorando, use algo leve e teu namorado agradecerá, pois os lenços dele durarão mais;
- quando escutar uma música que goste, não tamborile com os dedos sobre a mesa, que é um costume de velhos. Marque o compasso colocando a mandíbula para frente e para trás;
- faça amizade com os DJs das principais casas noturnas. Se conhecer mais de quatro, terá um status sensacional;
- se sai com um cara cinco anos mais velho, para impressioná-lo deve decorar estas duas profundíssimas frases: “A prospecção da consciência é a elaboração do nosso próprio destino” e “Ninguém tem direito ao supérfluo quando a alguém ainda falta o necessário”;
- se não lembrar bem destas frases, pede para ir a uma casa noturna e, ainda que erre na hora de falar, ele não vai conseguir ouvir, porque o seu amigo DJ sempre coloca a música no volume máximo.

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Esse texto não é meu, mas é um daqueles gostaria de ter escrito. Ele reflete muito bem a situação atual da nossa juventude.

Entretanto, ele foi publicado no dia 22 de agosto de 1971 no jornal argentino La Nación. O autor, Juan Carlos Colombres, mais conhecido pelo pseudônimo “Landrú”, é cartunista e humorista. Ilustrando a matéria, está uma charge de dois hippies que comentam entre si ao ver um senhor de terno: “Que audácia! Você conseguiria se vestir assim?”

Para a tradução algumas partes foram suprimidas (como a proibição de pedir aos gritos ao DJ a música “En un bosque de la China”, de Feliciano Brunelli) e outras adaptadas, como algumas referências a discos de vinil.

O principal está ali. Pensando bem, faz sentido que um texto de quase 36 anos ainda não esteja desatualizado. Afinal, não há nada de novo no front. Filmes ganham remakes, músicas têm releituras, livros são reeditados e os ídolos ainda são os mesmos, ainda que a juventude recente não tenha conhecido grande parte deles, pois já morreram. O que não tem senso é acreditar que a atual geração inventou a roda.

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