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terça-feira, outubro 02, 2007

Como vim parar aqui...

Antes de mais nada, esse post vai ser longo... não só porque faz quase um mês que não escrevo, mas porque o tema demanda espaço. Sugiro ler o próximo parágrafo. Se continuar, pegue um café e se ajeite na cadeira. Se não curtir a idéia, obrigado pela visita, volte sempre.

Há quase um mês o Piero me lançou mais um dos famosos memês. O primeiro foi um revival dos questionários dos cadernos das gurias na escola. O segundo pedia para falar do livro que estava lendo no momento. E, agora, os porquês da opção de ser jornalista. É uma ótima iniciativa, por ser um bom modo de ver como alguns loucos explicam a sua loucura...

As lembranças mais remotas me surgem sem definições de datas. Mas creio que estava com cinco anos, ainda não estudava, e estava com a mãe em Faxinal do Soturno, cidade dela. Fomos a uma mulher que lia mãos. Apenas me lembro dela dizendo que pelas mãos grandes e os dedos compridos eu tinha tudo para ser cirurgião. Detalhe que nunca fui fã do ambiente hospitalar. Acho que a vidente não se deu conta de que as mãos eram daquele tamanho porque eu era um guri grande.

Sem saber, a pergunta “o que você vai ser quando crescer” passou a me acompanhar desde então. Pensei em ser político. Abria a porta da Kombi do meu avô e fazia uns discursos. Corria 1989 e eu chamava alguns tios para brincar de debate. Eles eram o Lula (no jogo, o personagem mau) e eu era o... bom, eu era uma criança e a gente erra nessa idade.

Esse mesmo avô morava do lado da rodoviária de Faxinal, e aquele movimento me fez querer ser motorista de ônibus de longas distâncias. Viajar para longe, conhecer cidades desconhecidas, gente nova...

Mas numa manhã de 1993, fui abrir o portão para minha mãe ir ao trabalho e vi algo diferente na caixinha do correio. Um jornal. Um Correio do Povo, para ser mais exato (sem propaganda). “Pai, entregaram um jornal por engano aqui em casa!”. O velho parou o café e riu. “Não tem engano. Fizemos a assinatura. Mas você tem que ler. E não só o esporte. É importante pra ti.” E eu quase sempre lia. De trás para frente, como qualquer leitor do CP.

Nessa época, alguns dos velhos amigos vão lembrar que eu queria ser padre. É verdade. Eu estava influenciado pela catequese. Passada a primeira comunhão, achava que acabaria sendo advogado.

Não me preocupava muito com isso. O que gostava mesmo era de jogar futebol de botão. Organizava os torneios, pegava a mesa, colocava sobre uma velha pia e passava as tardes jogando. Para evitar comentários de favorecimento, o Grêmio não participava. Nunca o Juventude foi tantas vezes campeão. Narrava todas as partidas. Nas finais, pegava um rádio pequeno com microfone embutido e gravava a transmissão.

Mas pensava que ia ser advogado.

Às vezes, quando cansava de jogar botão, pegava uma velha máquina de escreve Olivetti portátil e escrevia. Cheguei a fazer um jornalzinho. Uma página, com os títulos e um texto breve. Não sei onde coloquei isso, mas lembro de algumas “matérias”: “Moradores do Rubem Berta reclamam da demora dos ônibus da Nortran” e a visionária “Shopping Praia de Belas planeja construção de cinemas no 3º andar”, algo que foi comentado muitos anos depois. Na época das eleições, saia para a rua para fazer pesquisa. Recortava do Correio as fotos dos candidatos, colava num papel e saia perguntando as intenções de voto dos vizinhos.

E se eles me perguntassem o que queria ser, eu dizia advogado.

O ano de 1995 foi o que mais me dediquei ao futebol como torcedor. Foi um dos tantos períodos de glória do Grêmio. Em especial pela conquista do bicampeonato da Libertadores da América. Escutava todos os jogos, rádio do lado da cama, e se o resultado não era bom, puxava um “Até a pé nos iremos...” até que o Jardel ia lá e marcava. Muitas vezes dormia com o rádio ligado. Quando acordava para ir à escola, ficava ouvindo as primeiras notícias da manhã. Durante o café, contava para o pai o que tinha escutado. A cotação do dólar comercial para a venda estava em um real, o ministro da Saúde ia fazer isso, o Presidente disse aquilo...

Nas férias, com uma filmadora na mão e muito tempo livre, juntávamos os amigos e fazíamos o Telejornal Besteira, que ia ao ar na fictícia TV Besteira - Canal Pirata. Eu era Cid Laranjeira, o âncora, mas também participava da encenação de algumas matérias se faltasse gente. Tínhamos um bom entrevistador, William Bonde, a participação de convidados famosos, como a roqueira Tim Mone, e até o quadro do Mr Bean Jr, feito pelo meu primo (quando franzia a testa ele ficava igual ao personagem inglês).

O tempo ia passando e eu estava cada vez mais convicto: ia fazer Direito.

Até que em outras férias, antes de começar o primeiro ano do segundo grau, fomos visitar uma tia do pai no interior. A filha dela estava lá e era radialista em Encantado. Ela começou a contar as histórias da rádio e como era o trabalho. Quando saímos de lá, dentro do carro, comentei: “É isso, vou fazer jornalismo.” Meus pais se olharam e apenas disseram para ter calma, que ainda tinha três anos para decidir.

Mas dias depois, no retorno à escola, numa aula de Psicologia (não sei porque, mas tive isso no 1º ano), o professor perguntou para cada um se já tinham se decidido sobre a profissão.

- Vou ser jornalista.

Enfim, a fichinha tinha caído. Não sei, mas escrevendo esse relato, fiquei pensando que talvez não tenha escolhido ser jornalista. O jornalismo me perseguia e eu não me dava conta. Pode parecer meio pretensioso, mas com tantas coisas que aconteceram na minha vida, parece que atendi um chamado. Acho que a profissão me escolheu. Ainda bem. Não sei como me sairia num tribunal.

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